Nova era para a ciência islâmica?, artigo de H. T. Goranson
Os EUA, têm substituído a ciência por "questões de fé", em todos os
escalões do governo, do presidente para baixo, e esse é o seu equívoco
H. T. Goranson é o principal cientista da Sirius-Beta Corp; foi Cientista
Sênior na Agência de Projetos de Pesquisa Avançada da Secretaria da Defesa
dos EUA. © Project Syndicate 2006. http://www.project-syndicate.org. Artigo
publicado no “Valor Econômico”:
Durante algumas centenas de anos, quando a Ciência e as Ciências
Matemáticas gozavam um período de grande poder inventivo, uma região do
mundo sobressaiu.
Mestres dessas disciplinas foram reverenciados lá, a Medicina avançou
velozmente e as pessoas comuns ficaram curiosas em saber como a natureza
funcionava. Não surpreende que essa região seja mundialmente respeitada.
Na outra metade do planeta conhecido, cientistas eram punidos, até mortos.
As Ciências Matemáticas foram proscritas por serem não-religiosas e
alienígenas, e mais tarde foram transformadas em matérias subservientes à
religião. O padrão de vida era baixo.
A região próspera era o Oriente Médio islâmico, enquanto uma Europa
ignorante permanecia pobre.
As duas regiões eram governadas religiosamente (historiadores divergem
sobre o papel e a natureza das religiões neste contexto), mas a ciência só
floresceu em uma delas. Agora, naturalmente, os papéis do Oriente Médio
Islâmico e do Ocidente estão invertidos.
Desde a Segunda Guerra Mundial os EUA têm sido líderes incontestes do mundo
em Ciências. Ao longo desse período, os estudantes mais brilhantes foram
afastados das suas terras natais, atraídos pelas oportunidades e
universidades de pesquisa superiores.
Até recentemente, mais de metade de todos os estudantes graduados nos EUA
em Matemática, Ciências e Engenharia era nascida no exterior. Muitos desses
talentos permaneciam no país após a formatura, e tanto a indústria quanto o
governo tiraram proveito desta situação.
Enquanto isso, as culturas islâmicas entraram numa fase histórica na qual a
ciência foi condenada como uma influência ocidental e evitada.
Mesmo nos países em que as receitas com o petróleo poderiam alimentar uma
quantidade substancial de pesquisa, os dirigentes árabes não estimularam
esse tipo de investimento, com o resultado de que as suas sociedades não
prosperaram tanto quanto poderiam.
Recentemente, um desejo por maior respeito político estimulou os países
islâmicos a investirem em tecnologia, o que é mais visível nas ambições
nucleares paquistanesas e iranianas. Apesar de estes artefatos nucleares
terem peso político, a tecnologia por trás delas é mundana e antiga.
Mais significativo é o respeito que emana de observações elaboradas, não de
produtos de descobertas passadas. Imagine a influência que seria gerada por
um instituto paquistanês que fosse líder mundial em pesquisa de câncer.
A retórica política mudaria se pesquisadores em Omã descobrissem uma
fórmula para suprimir a AIDS?
Esta é uma oportunidade não reivindicada. Mas existe outra, e não só para
sociedades islâmicas. Os EUA cometeram alguns profundos deslizes
recentemente.
"Questões de fé" têm sido substituídas por ciência em todos os escalões do
governo, do presidente para baixo.
Pesquisadores proeminentes tiveram seus relatórios alterados por operadores
políticos quando os fatos contradiziam a crença oficial. Estimulados por
uma administração influenciada religiosamente, sistemas escolares estão
alterando o seu enfoque, da ciência para "valores".
Desde os atentados terroristas de setembro de 2001, os vistos de entrada
são emitidos em menor número e são mais difíceis de obter, estancando o
fluxo de talentos jovens às universidades dos EUA. Organizações científicas
renomadas protestaram, sem resultado.
Ao mesmo tempo, leis tributárias foram revisadas para tornar os
investidores mais ricos no curto prazo, desestimulando investimentos de
longo prazo em pesquisa.
Meio trilhão de dólares foram empenhados na guerra no Iraque, soma
praticamente igual ao patrocínio de toda a pesquisa básica nos últimos mil
anos. Mesmo se os EUA evitarem uma idade negra fundamentalista, eles
claramente arriscam-se a perder o seu predomínio em pesquisa global.
O Japão reconheceu a conexão entre influência política e ciência na década
de 1980. O principal homem da indústria do Japão, Akio Morita, presidente
da Sony, e o político de direita Shintaro Ishihara proferiram uma série de
discursos que foram reunidos e publicados em 1986 na forma de um livro
chamado "The Japan That Can Say No" [O Japão que pode dizer não].
Eles delinearam uma estratégia nacional na qual a influência mundial
deveria fluir a partir da liderança científica. A idéia chave foi que o
poderio militar poderia ser tornado obsoleto se a "cadeia alimentar" das
tecnologias militares fosse controlada por outros países.
O título do livro refere-se ao plano do Japão de "dizer não" à influência
militar dos EUA assim que o Japão controlasse tecnologias militares
estratégicas.
Construir uma economia baseada em conhecimento usando a riqueza do petróleo
é certamente possível. O Texas, por exemplo, como a maioria dos Estados do
Sul dos EUA, já foi economicamente pobre e decadente.
Embora tivesse receitas do petróleo, o fluxo de dólares numa economia, em
si, não impulsiona a prosperidade na medida em que se poderia imaginar.
Então o Texas decidiu dedicar o dinheiro do seu petróleo a um fundo
educacional.
Hoje aquele fundo é praticamente igual ao da Universidade Harvard e está
disperso por 15 universidades. O efeito tem sido assombroso: a indústria
aeroespacial quase desapareceu da Califórnia, mas está se desenvolvendo
rapidamente no Texas.
Centros de pesquisa de telecomunicações e consórcios convergiram para o
Texas, até da gigante de telecomunicações canadense Nortel. Apesar de a
atividade fabril nos EUA estar em crise, o Texas tem uma das mais poderosas
economias fabris no mundo.
Não há motivo para que o mesmo resultado não possa ser obtido no Oriente
Médio. Primeiro, porém, o mundo islâmico deve redescobrir e adotar a sua
altiva herança.
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