Entrevista: Maria da Conceição Tavares
Sem o garrote do FMI
Mauricio Dias para a Carta Capital
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Impulsiva, vibrante, ágil no raciocínio. Maria da Conceição Tavares fala
aos jorros sem perder a coerência, o brilho e a coragem como se verá nesta
entrevista a CartaCapital, na qual ela defende as ações de Lula com
emoção, mas, também, com uma qualidade de argumentação incomum em muitos
integrantes do governo.
Um dos pontos que afirma é o de que o governo Lula não repete a política
econômica de Fernando Henrique Cardoso. Ela dá uma importância fundamental
a uma diferença: o pagamento de US$ 15 bilhões ao Fundo Monetário
Internacional. Isso teria livrado o País, pelos próximos dez anos, do
garrote internacional.
Ela mostra outros pontos de divergência. Lembra, por exemplo, que Lula
barrou o andamento do neoliberalismo, estancou as privatizações,
reestrutura o Estado brasileiro e não vocaliza a política de Washington.
Satisfeita com muitas das ações do governo em defesa da população “de
baixo”, no entanto, reclama: “Não é o governo dos nossos sonhos”.
Aos 75 anos ela, não desanima e nem vacila quando pensa na eleição de
2006: “Espero que não ganhe a visão dos tucanos neoliberais. Tudo, com
eles, regredirá. Esse capitalismo que pregam é violentamente regressivo
tanto nas relações com o trabalho, quanto na relação do Estado com o
capital e com a cidadania. Eles só querem apagar direitos. Se possível,
todos aqueles conquistados no século XX”.
Nem a ditadura militar tentou fazer isso. Mas ela não duvida que os
economistas tucanos façam, pois já pregam as reformas de segunda geração.
Por isso, ela se põe a favor da reeleição de Lula. Quer que ele mesmo
“impeça o desmonte do que já conseguiu conquistar”. Abaixo os trechos
principais da entrevista.
CartaCapital: O governo fechará o ano com a antecipação do pagamento de
US$ 15 bilhões ao FMI. Por que os brasileiros, além dos economistas, devem
comemorar esse resultado?
Maria da Conceição Tavares: Ao pagarmos o Fundo Monetário chegaremos a uma
relação “dívida externa e PIB” que, finalmente, apagou o que o governo do
Fernando Henrique fez. Isso é espantoso: é a melhor relação dívida externa
versus Produto Interno Bruto dos últimos 40 ou 50 anos. Conseguimos sair
do atoleiro, da fragilidade da crise cambial. Ou seja, crise cambial mata.
A crise fiscal, no entanto, esfola.
CC: Quem é esfolado no momento?
MCT: No momento a crise fiscal está esfolando o povo, a classe média e os
construtores.
CC: E os juros? Por que está todo mundo indignado com a taxa?
MCT: Tem muita gente ganhando com a taxa alta. As grandes empresas
protegem-se com aplicações financeiras.
CC: Então, por que a reclamação?
MCT: Porque não há investimento público. Isso quer dizer que vários dos
grupos tradicionais de poder não levam nada. A classe média não leva nada.
Quem tem levado é o pessoal “de baixo”. Mesmo em 2003, o ano de
crescimento zero, tivemos um aumento do mínimo acima do PIB per capita. Em
2004, aconteceu o mesmo e esse ano também. Seguramente, em 2006 será
assim. É a primeira vez que, de uma maneira contínua, um governo sobe o
salário mínimo com regras. Regras a favor do mínimo. É a primeira vez,
também, que se faz um esforço de formalização do mercado de trabalho,
depois de mais uma década de informalização, terceirização etc. Há três
boas notícias trazidas pela PNAD: a reversão do salário dos “de baixo”; a
reversão do desemprego e da renda também dos “de baixo”.
CC: À custa dos ricos, acusam...
MCT: Os ricos somos nós, a classe média. À custa da classe média que,
aliás, mantinha uma frente grande dos salários menores. Em resumo, é a
distribuição melhor dos salários, que no Brasil ainda é pérfida. Então,
agora, pagou a turma de cima. E reclamam que o emprego gerado foi para os
“de baixo” e não para os filhos da classe média alta. Alguém esperava que
o governo Lula fosse gerar prioritariamente emprego para o pessoal da
classe média alta dos Jardins, em São Paulo? Estão brincando, não? Os “de
baixo” nunca levaram colher de chá. Os empregos de agora foram gerados
para assalariados que ganham em torno de um salário mínimo ou que têm o
salário mínimo como referência. Isso é fundamental para melhorar a
pirâmide dos salários. Isso foi prometido e feito sem nenhum entendimento
das autoridades econômicas.
CC: Como assim?
MCT: Eles atiram no que vêem e acertam o que não vêem. Porque,
evidentemente, aqueles meninos do Banco Central continuam com aquele
modelito ridículo que todo mundo já criticou. Por que é que não se
perguntou, na prática, para o que é que serviu essa taxa de câmbio
valorizado.
CC: Há quem acredite que se trata de populismo cambial.
MCT: Mentira.
CC: Qual a diferença do que foi feito no governo FHC?
MCT: Aquele era populismo cambial porque com aquele câmbio ele conseguia
dar uma cesta mais barata. Arrebentou, por isso, com a agricultura de
exportação, arrebentou com a indústria. Enfim, arrebentou com a estrutura
produtiva. E nos pespegou uma dívida interna e externa numa rapidez
colossal. Estourou os endividamentos interno e externo. E tudo o que ele
trazia de capital para fechar o balanço de pagamentos era para importar
bens de consumo. Foi aquele delírio de consumo. Aquilo era populismo.
CC: Um populismo que a classe média adorava...
MCT: Exatamente. Para a classe média. Até que teve de reverter e fazer a
desvalorização. E nos deixou quebrados. Sabe qual era a relação “dívida
externa e exportações”? Era três vezes maior. Hoje é só 1,1 vez maior.
Sabe qual era quando nós quebramos em 1999? Era de 3,97%. Isso é
praticamente 4%. Com essa relação, os países quebram. Só se tem reserva,
de fato, quando se diminui o endividamento. Reserva com endividamento
crescente, como no governo FHC, não quer dizer nada. Agora, sim. Olha como
os governos não se parecem, ao contrário do que alguns dizem por aí. Há,
hoje, reservas internacionais líquidas de US$ 52 bilhões. Há uma queda na
dívida externa, pública e privada, enorme.
CC: No capítulo de investimento público a coisa parece muito igual.
MCT: Agora também é quase nada. O arrocho fiscal de agora é mais violento
do que antes. Isso ocorre porque a taxa de juros está lá em cima. Não ao
ponto que o governo FHC tinha elevado. Dever ao Fundo, como se devia, é
uma desgraça. Agora pagamos e há reservas de US$ 52 bilhões e uma dívida
externa reduzida em mais de 40%. Há uma política conseqüente. Resolvida
essa dívida de curto prazo, a estrutura da dívida externa está
perfeitamente “o.k.” para os próximos dez anos.
CC: Por que não “batem lata” para isso? Esqueceram a dívida externa?
MCT: Porque não têm sensibilidade. Por que é que em nenhuma ata do Copom
isso está relacionado? Fala-se sempre da inflação. São uns beócios. Agora,
se não baixar os juros eles serão umas toupeiras. Aí o presidente Lula vai
ter de dar uma chicotada. Eles eram dependentes do mercado e agora o
mercado sinalizou.
CC: O mote deles é a inflação...
MCT: Inflação, taxa de juros e câmbio. Não conseguem ver além disso. Mas o
que aconteceu com o endividamento externo? Eu continuo não crendo que esse
modelo não vai fazer bem ao presidente principalmente no ano da eleição.
Não creio. Abriu-se agora um novo período.
CC: A partir do pagamento ao FMI?
MCT: Sim. Isso significa que a restrição externa que vem lá de trás, desde
o começo dos anos 1980, está equacionada. Agora, sim, dá para desmontar
uma das patas da armadilha macroeconômica. Dá para baixar, a sério, a taxa
de juros. Agora, sim, temos condições de retomar o crescimento. Mas, um
pequeno detalhe, como o crescimento até agora era um miniciclo de consumo
e, no caso do governo Lula, miniciclo de consumo e de exportações no ano
passado que soltaram o crédito para o povão...
CC: Mas dizem que o povão estava endividado.
MCT: O povão já estava endividado. Só que na Casas Bahia e, portanto,
pagava um juro indescritível. Hoje ele já pode comprar a televisão, a
geladeira, em módicas prestações com o crédito de outra maneira. O Mário
Henrique Simonsen me contava que cansou de explicar para a mãe dele duas
coisas que ela jamais entendeu: a tal da correção monetária e a porcaria
da taxa de juros. Economista não consegue explicar certas coisas nem para
a própria mãe. Para o povão, quando abaixa a prestação, aumenta o número
delas e ainda pode descontar em folha está ótimo. Nesse sentido, o governo
fez outras coisas, como a Previdência generalizada para os velhinhos.
Altamente distributivo. Para valer. O maior programa distributivo do País
é a Previdência Social dos aposentados que dá uma renda enorme.
Principalmente no Nordeste...
CC: No Nordeste?
MCT: Seguramente. Onde é que deu renda maior nesses programas sociais
todos? No Nordeste. Onde a Bolsa Família é mais importante? No Nordeste.
Onde é que Lula está pensando em retomar os projetos estruturantes? Na
região mais atrasada. No Nordeste. É o caso da ferrovia e da interligação
das bacias que o pessoal fica dizendo que é a transposição do São
Francisco? Não é transposição, é ligação das bacias para que não haja
sobra de água de um lado e seca do outro. Enfim, o de sempre. Espero que
ninguém interrompa esses projetos. Não se pode interromper os projetos
estruturantes e, também, os projetos sul-americanos de integração que Lula
fez graças às boas relações que ele tem tanto com o Kirchner quanto com o
venezuelano (Chávez).
CC: A senhora também cobrava, antes, a retomada do crescimento.
MCT: Cobrava antes porque era miniciclo. Era vôo de galinha. Eu sempre
disse que com aquela política era vôo de galinha. Neste último ano, como
sobrou liquidez no mundo e nós reestruturamos a dívida externa, a coisa
mudou. Mas não se esqueça que eu estou em silêncio há muito. Só falei uma
coisinha aqui e outra ali.
CC: A hora de retomar o crescimento chega no ano eleitoral. Coincidência?
MCT: Não. Azar. Ninguém vai perceber porque isso não é eleitoral. Esse é o
problema. Isto é uma política de reestruturação. Está se reestruturando o
setor público. Pararam as privatizações. Está se tentando reestruturar o
setor elétrico. Tudo isso, com exceção dos programas diretamente
populares, é invisível. Você acha que o povão dá conta do que eu estou
falando?
CC: Qual a importância que a senhora vê no fato de, após tantos anos, a
moeda brasileira, o real, estar cotada na Bloomberg? Por que isso?
MCT: Havia alguma cotação no tempo do “real forte” do governo FHC? Não.
Porque não era forte coisa nenhuma. Tudo o que eu disse sobre aquele plano
que, aliás, me custou bastante pancada dentro do partido... Eu e o
Mercadante levamos muita pancada porque, depois, deu certo... deu certo a
curto prazo. A questão é avaliar a herança pesada que deixou. Estamos
metidos numa herança, essa é a verdadeira “herança maldita”. Por isso, vem
um e diz que está continuando a política do Fernando Henrique. Há até
ministros nossos, de direita, na área econômica, que não entendem nada do
que estão falando, assumiram esse papo. Continuamos nada.
CC: Explique melhor, por favor.
MCT: As razões pelas quais foi necessária essa valorização foi para
comprar reservas baratas, pagar a dívida externa privada, reestruturar a
dívida pública e contratá-la em melhor situação. Em 2004 crescemos,
exportamos como gigantes. O salário cresce, o emprego cresce e não batia
nada com o diagnóstico. Evidente que o PIB caiu por ser um miniciclo.
CC: Mas o PIB caiu. Pode crescer mais em 2006?
MCT: O PIB caiu por ser um miniciclo. Não sei o quanto o PIB pode crescer.
Vamos ver. Pode chegar a 4%. Não é o que a gente quer, mas é que ainda não
estão postas as condições internas de retomada do crescimento. Que é,
basicamente, o investimento público. Para isso é preciso baixar os juros
para que eles não comam o investimento. Não há mais argumento para manter
o câmbio tão valorizado. Diminuímos a dívida interna, dolarizada,
radicalmente. E para manter estável a relação da dívida interna com o PIB
tivemos de mandar o pau no superávit. Foi preciso. Mas tanto eles não
entendem que propuseram aquela estupidez do superávit crescente para 5%
nos próximos dez anos.
CC: Isso aconteceu, então, apesar deles.
MCT: Não é apesar de... Há muitos operadores ainda bons que são do ramo.
Apesar dos ministros, das declarações que dão, dos “Delfins Nettos”. Fico
pasma. Por que se está emitindo títulos em real? É porque todo mundo supõe
que não vai desvalorizar. Ou vai ser desvalorizado de forma
insignificante. Dado, no entanto, que emitimos a juros de 12,5% em dólar.
Isso significa que a taxa não deverá ficar muito abaixo de 14%. Esse é o
problema. Mas ela está em 18%. Portanto, há folga. E essa folga para as
contas públicas é essencial. Veja a contradição: como é que se critica a
política monetária e o juro e, depois, se propõe os 5% permanentes do PIB?
Ora, isso é o que empurra a taxa de juros para o patamar que está. Essa
armadilha tem de ser discutida com toda a seriedade. Incluindo, agora,
essa liberdade adquirida quanto à restrição externa e o que Lula fez para
melhorar a situação dos mais pobres e dos assalariados em torno do mínimo.
É o grosso da população.
CC: A classe média alta está pagando a conta.
MCT: Eles pagaram o pato agora. Achatou-se os de cima e puxou-se os de
baixo. Foi achatado o leque de salários que, no caso brasileiro, é um
escândalo.
CC: Por que chegou a esse ponto?
MCT: Porque deixaram o salário mínimo cair a níveis inacreditáveis. O
doutor Getúlio deve estar se removendo na tumba.
CC: Agora, no entanto, ele deve estar um pouco mais feliz.
MCT: Pelo menos isto. É a primeira vez que os sindicatos dos trabalhadores
conseguem negociações coletivas acima da inflação. Há anos que isso não
acontecia. Estão melhorando as condições do trabalho. Isso é inegável.
Agora vem a ameaça dos homens das Casas das Garças com as reformas de
segunda geração. Que é o Banco Central independente, flexibilização da
legislação trabalhista, a última flexibilização possível para comércio e
movimento de capitais. E, finalmente, retomar as privatizações.
CC: Qual o alvo nas privatizações?
MCT: No primeiro acordo com o Fundo que o Fernando Henrique fez, eu estava
na Câmara, eles queriam privatizar o Banco do Brasil, o BNDES e a Caixa
Econômica. Acha que eles deixaram de querer? Coisa nenhuma. Eles
consideram que esses bancos públicos competem com eles. Quando, na
verdade, os bancos públicos são os que permitem alavancar recursos para
financiar o crescimento. O primeiro requerimento do crescimento
sustentável que era afastar a restrição externa.
CC: É possível, de fato, retomar o crescimento?
MCT: Agora, sim. Essa era a primeira barreira. Mas o governo tem, também,
de continuar puxando a renda dos “de baixo” porque, como ainda está, não
diminuiremos a heterogeneidade social. Nosso quadro exige primeiro emprego
e renda para os “de baixo”. Evidentemente, enquanto isso se faz políticas
sociais compensatórias. A terceira barreira é a falta de investimento
público. Isso só se supera baixando os juros e livrando os bancos públicos
das restrições impostas pelo Banco Central.
CC: A senhora é contra a exposição da divergência entre os ministros?
MCT: Mas como não haver divergência pública se alguns estão se metendo
onde não são chamados? E todos eles vêm argumentar a favor dessa
interferência, todos eles, começando pelos economistas da PUC que se
reúnem na Casa das Garças. Esse Pérsio Arida, essa gente toda, que no
Cruzado tinham boas intenções, depois que viraram banqueiro estão, claro,
com péssimas intenções.
CC: A senhora já pôs as mãos no fogo por alguns deles na época do Cruzado.
MCT: E queimei. Não ponho mais as mãos no fogo por ninguém, como pus para
esses meninos. O Pérsio Arida, o André Lara Resende e o Mendonça de
Barros. No caso do Malan (Pedro) eu queimei as mãos e o coração. Eu
gostava muito dele. Todos viraram banqueiros. Isso faz, evidentemente, que
eles digam o contrário da gente. Estão defendendo os interesses deles ao
contrário da gente, é óbvio.
CC: Mudando de assunto. As exportações vão continuar subindo?
MCT: Vamos continuar subindo, mas, como disse o próprio ministro
Rodrigues, muito mais devagar. Crescemos mais que a economia mundial.
Outra coisa que ninguém se dá conta é a idiotice do primeiro quadriênio do
Fernando Henrique. Ele abriu a economia do ponto de vista micro, estourou
as empresas, e do ponto de vista macro fechou. Não exportávamos nada por
causa da taxa de câmbio populista. Em resumo: o que fizemos nos últimos
dois anos foi recuperar o País da situação que aqueles infelizes montaram
de 1994 em diante. Pelo menos do ponto de vista do comércio exterior,
inserção internacional e dívida externa nós nos recuperamos da monstruosa
trapalhada que foi feita.
O PAÍS
Rio, 20 de julho de 2006
Vaia de 120 mil pessoas, é a maior dada a um político brasileiro.
SÃO PAULO. O ex-prefeito José Serra, candidato do PSDB a governador de São
Paulo, chegou ao velório do ator Raul Cortez por volta da 15h45m e logo
que desceu do carro foi vaiado por uma multidão que se aglomerava na
porta do Teatro Municipal e gritava “fora” , “mentiroso” e "enganador'.
Serra fugiu pelos fundos. Ficou no velório por meia hora.
Um comentário:
Não acredite em tudo que ouve na mídia.
Você realmente acredita que Lula ou o PT faria uma coisa dessas?
Estão querendo dar um golpe, querem derubar o melhor governo que esse País já viu!
CRÔNICA - LULA MIRANDA
Crônica de um golpe anunciado
Sete perguntas que, se mal respondidas, deixam evidentes a grotesca armação que tentam colar na candidatura petista às vesperas da eleição, quando as pesquisas sentenciam sua vitória.
Lula Miranda
Vimos acompanhando todos, já faz alguns meses, inúmeros pedidos de impeachment sendo plantados e acalentados pela grande imprensa, semana sim semana também. O esdrúxulo e extemporâneo impeachment não colou, pois, além de não haver base legal que justificasse o impedimento do presidente da República, como se sabe, Luiz Inácio Lula da Silva e seu governo têm altos índices de aprovação junto à população. A "vocalização" do impedimento do presidente na grande imprensa parecia ter apenas a intenção de causar ao governo algum desgaste político. Parecia. Mas, percebe-se agora, visava preparar o terreno para um golpe que pretende desalojar Lula do Palácio do Planalto "na raça", na base do golpe sujo, utilizando-se de métodos escusos.
Os velhos "donos do poder" (utilizando-se de expressão cunhada por Faoro) desejam a chefia do executivo federal de volta às suas mãos de qualquer jeito – pois o poder seria deles "de direito", algo que lhes seria devido, inato. Como a candidatura do "decepcionante" Alckmin não decolou, a última cartada seria mesmo "ganhar no tapetão".
Primeiro, a 15 dias das eleições, arma-se uma arapuca "fatal" para Lula e o PT (seu partido). Com a devida manipulação do episódios na mídia, cria-se um clima de comoção, decepção e desalento, e faz-se, em seguida, pesquisas no calor da hora. Se nem assim o candidato dos "coronéis" (os cordatos e os nem tanto) subir, manipulam-se algumas pesquisas. E, se nem com essa bem urdida "arapuca", conseguirem acabar com a candidatura Lula, o jeito seria embargar sua candidatura na Justiça ou, se eleito, impedi-lo de governar criando várias CPIs e revivendo o turbilhão político do último ano e meio de seu primeiro mandato. O lance é não permitir um segundo mandato, de qualquer jeito. Vamos à cronologia e etapas dos últimos acontecimentos.
Na semana do feriado de 7 de setembro, começaram a circular boatos de que uma "bomba" envolvendo o presidente Lula estava por ser detonada pela oposição – envolveria pessoa muito próxima ao presidente e seria avassaladora. Como esse tipo de "chantagem", boatos e ameaças são comuns ao jogo eleitoral, não lhes dei muita atenção e importância. Na semana seguinte ao 7 de Setembro, já na segunda-feira, 11, porém, os boatos começaram a se intensificar.
Foi quando, para minha surpresa, no dia 14, surgiu pela primeira vez na "blogosfera", mais precisamente no blog do Noblat, a notícia de que vinha, sim, uma bomba, mas era, ao contrário do esperado, um artefato que explodiria no colo da candidatura de José Serra: em entrevista os Vedoin (pai e filho) comprometiam José Serra com a chamada máfia dos "sanguessugas", mostrando, inclusive, farta documentação comprobatória. Noblat postou essa notícia às 21h12 do dia 14 como já dito. Acompanhei a repercussão dessa notícia, durante todo o dia 14, nos sites das grandes empresas jornalísticas. Não houve. Não saiu uma nota sequer. No dia seguinte, procurei nos jornais dos grandes grupos de comunicação: nem uma notinha de pé de página (registro que o "blog do Noblat" é acolhido pelo grupo O Estado de São Paulo, um jornal, todos sabem, "de direita", conservador). Curiosamente, a notícia, inicialmente postada pelo Noblat, só começou a ser veiculada na Folha e em outros "jornalões" quando já se tinha a notícia de que duas pessoas supostamente ligadas ao PT haviam sido presas com R$1,7 milhão que seriam utilizados para comprar um tal dossiê envolvendo José Serra e Geraldo Alckmin (esse seria supostamente o ingrediente novo: o envolvimento de Alckmin) com a máfia das ambulâncias (ou dos "sanguessugas", como queira). O que antes parecia algo restrito a atingir a candidatura de José Serra ao governo do estado de São Paulo, também resvalava em Alckmin. Na verdade, comprovar-se-ia depois, a intenção daquele episódio todo era atingir a candidatura Lula – agora, com a citação em depoimento de um assessor do presidente isso ficou evidenciado. Bingo! O petardo havia então acertado o alvo. O foco central, a notícia sobre o envolvimento de Serra com a máfia dos "sanguessugas", foi abandonado, deixado de lado. O foco da notícia agora passava a ser o Partido dos Trabalhadores e o governo Lula. O PT e Lula estavam de volta ao patíbulo.
O que estava ocorrendo, afinal? – perguntavam-se todos, entre incrédulos e perplexos. Uma bem urdida "armação? Uma orquestração? Uma "arapuca" armada pelos tucanos e/ou pefelistas, que haviam buscado aproximar os Vedoin de petistas desavisados? Compraram alguns "petistas" na bacia das almas? – na verdade, pessoas infiltradas no partido Ou seria mais uma "tremenda vacilada" de algum petista incauto? Para quem ainda se lembrava do inverossímil episódio dos tais dólares na cueca, tudo era possível. Mas, algumas perguntas restam ser respondidas, pois há indícios sérios, mais ou menos evidentes, que nos causam estranheza ou, no mínimo, desconfiança de uma armação.
1. Por que um dos cidadãos detidos foi logo dizendo, de imediato, que era do PT? Só faltou, para ficar bem na foto, a camisa do PT vestindo o meliante. Lembram do seqüestro de Abílio Diniz – hoje com Lula? Não seria esperado que ele, o cidadão detido em flagrante, caso estivesse realmente a serviço do partido, não revelasse essa informação nem sob tortura?
2. Por que supostos petistas comprariam por, repito, R$1,7 milhão um "dossiê" que continha fatos e informações que não valiam nem um tostão furado – disseram que pediram inicialmente R$20 milhões? Aquelas fotos já haviam saído na imprensa e sido amplamente divulgadas.
3. Por que os petistas, sabendo que os Vedoin estavam sob investigação da Polícia Federal e do Ministério Público, não avisariam a própria PF e ao MP sob a tentativa dos indiciados de vender-lhes essas provas? – assim eles obteriam as provas graciosamente e ainda incriminariam mais os verdadeiramente envolvidos com a máfia (os Vedoin e agora, ao que parece, José Serra).
4. Por que só agora resolveram denunciar José Serra? Estavam negociando o dossiê antes com o PSDB?
5. Por que envolveram, de imediato, um assessor da Presidência da República nessa mal contada história – se o depoente não sabia sequer precisar o nome da pessoa. Por que na acareação o acusador tão falante até então, calou-se?
6. Afinal, quem negociou por parte do PT foi o Diretório Estadual, como se disse no início, ou o Nacional, como se diz agora? Não é estranho que um militante recém-ingressado no partido (filiou-se em 2004) seja destacado para tão importante, delicada e "suicida" missão às vésperas da eleição?
7. E esse novo episódio do grampo nos telefones dos ministros do TSE? Não lhes parece estranho? Por que a varredura foi feita? Por que foi divulgada sem que antes houvesse uma necessária investigação? A quem interessaria a essa altura conturbar o processo eleitoral? É da democracia que o presidente do TSE reúna-se com políticos da oposição para estudarem juntos uma forma de impugnar a candidatura do presidente em exercício? Certamente que não!
Enfim, prezado leitores, é tão absurda e impensável toda essa situação que só mesmo aguardando uma competente e acurada investigação da Polícia Federal. Não precipitemos o julgamento. Foi armação? Teria sido uma contramedida de uma dos "gestapos" incrustados no Estado para favorecer José Serra – lembram-se do caso Lunus, que destruiu a candidatura de Roseana Sarney? Lembram do Dossiê Cayman – era verdadeiro ou não? E a lista de Furnas? E a pasta rosa? Há uma vasta oferta de Dossiês no mercado negro da política.
Só que, passado o calor do momento, para o dia 1º de outubro, o estrago na campanha à reeleição de Lula já terá sido fato consumado. Ao passo que a campanha de Alckmin, e, principalmente, a do Serra, passam incólumes. Quem foi a priori condenado nesse episódio, pela grande imprensa, foi, de novo, o PT. Será esse episódio suficiente e necessário para servir como um novo pretexto a um recrudescimento do já evidente parcialismo da grande imprensa pró-Alckmin e pró-Serra? Só nos restar aguardar, e, de olhos bem atentos e vigilantes, reclamar um tratamento mais equânime às candidaturas na mídia. E denunciar, sempre.
E que não insistam em velhas receitas e estratégias golpistas, pois, essa democracia que aí está, com toda sua fragilidade e podridão, hipocrisia e "gansgsterianismo" das máfias políticas, é a que temos, por enquanto, enquanto a tão necessária reforma política não vem. E se o "rei" tentar derrubar o "peão" "no tapetão" sairemos todos às ruas para, como nas Diretas-Já, fazer valer a vontade do povo.
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