quarta-feira, agosto 23, 2006

Excelência ameaçada

Excelência ameaçada . . .

Márcio Dayrell Batitucci ( * )


Nos Manuais de Administração, estão profusamente listados e explicados os múltiplos percursos, fatores e circunstâncias que podem conduzir uma Organização à gradativa perda de sua Excelência. Mas, em linhas gerais, há quase um consenso entre os especialistas que, independente de outras condições favoráveis, o caminho mais curto para se chegar à essa indesejada situação, é a existência de uma Gestão inadequada.
E nesse mesmo consenso perceptivo, a má Gestão dos Recursos Humanos tem sido apontada como o ponto básico que pode dar a partida para todo um processo de deteriorização organizacional.
O mais conceituado especialista da Gestão de nossos tempos, Peter Drucker, foi mais á frente ao defender que o Gestor da Empresa moderna competitiva, deveria aplicar a maior parte de seu tempo e de sua energia gerenciais, no aprimoramento das Políticas e da Gestão de R. H.

1 - A Construção da Excelência

Em 1923, o mestre Shewhart definiu antologicamente qual seria a “Missão” de qualquer Organização : satisfazer as pessoas, entendidas como sendo os Acionistas, os Clientes-Fornecedores, a Sociedade e o Corpo de Colabora-dores.

Algumas vezes, em minhas Palestras, para explicar concretamente o que significa “satisfazer as pessoas” , tenho colocado uma cadeira em cima da mesa e mostrado aos presentes :

- Esta é a “ Empresa de quatro pernas”, cada uma delas representando as “pessoas” do mestre Shewhart : ela é sólida, firme, não é atingida pelos ventos das circunstâncias, é confiável, não irá cair, independente do peso que lhe é colocado em cima. Em resumo é Excelente ! À medida que tiramos uma das pernas dessa “ cadeira-Empresa “ , ela vai se tornando menos confiável e menos excelente. A “cadeira-Empresa” de duas ou uma pernas, certamente irá cair, não conseguindo mais atingir seus objetivos . . .

Assim, a Empresa Excelente será aquela que conseguir satisfazer adequada e equilibradamente àquelas “ quatro pessoas ” , quando estará sempre em crescimento, será sempre sólida e cumprirá de modo excelente sua Missão e seus objetivos. Se ela atende somente “ três pessoas “, sua excelência começa a ficar ameaçada e ela pode ter dificuldades comprometedoras. Se ela atende a apenas “ duas “ ou “ uma pessoa “, ela certamente enfrentará dificuldades insuperáveis e irá se destruir a médio e longo prazos .
Conforme mostrado acima, há consenso que a responsável direta por essa “satisfação das quatro pessoas ” e a conseqüente excelência da Empresa, é uma Gestão também excelente, respaldada por uma adequada Política de Recursos Humanos.

Dentro dessas premissas e nesse cenário de excelência plena ou de excelência ameaçada, vamos acompanhar a trajetória da maior Empresa do Hemisfério Sul, a Petrobrás que, por muitos anos, seguiu à risca essa cartilha da boa Gestão e, sempre respaldada por uma das mais avançadas Políticas de Recursos Humanos, conseguiu cumprir com brilhantismo sua Missão, satisfazendo equilibradamente “ as quatro pessoas “.

Sem me ater às suas múltiplas conquistas tecnológicas - por demais conhecidas de todos - e fruto direto de sua Gestão de Excelência, vou perpassar e me ater à algumas de suas facetas pouco visíveis, especificamente relacionadas às suas Políticas de Gestão de Pessoas.

A Petrobrás, muitos hoje não sabem, foi pioneira e modelo obrigatório para centenas de Organizações brasileiras, em uma dezena de ações e práticas pouco usuais ou inexistentes naqueles primeiros tempos, onde imperavam ainda os velhos e limitados “princípios” da administração clássica tradicional .

Assim, entre tantos novos caminhos, ela pioneiramente :

* Investiu pesado na formação, no desenvolvimento e na especialização de sua força de trabalho especializada, recrutada dentro das mais modernas técnicas e processos de seleção da época, inclusive utilizando-se da quase-desconhecida ““avaliação psicológica” de então.

* Criou os “Setores de Ensino” do Rio e de Salvador, onde era formada a nata dos especialistas na recém instalada indústria do petróleo, - inexistente no mercado - e que podem ser considerados como as primeiras “Universidades Corporativas” brasileiras, hoje uma realidade consolidada e essencial nas grandes Corporações nacionais.

* Implantou, com a mesma visão de longo prazo e de busca da Excelência, os “Centros de Treinamento” das diversas Unidades Operacionais, verdadeiras “Escolas Técnicas privadas”, dotadas de estrutura física adequada, recursos tecnológicos e didáticos, corpo de professores internos altamente qualificados, instalações industriais à mão para os estágios práticos, equipe gestora com estrutura organizacional própria qualificada e especificamente voltada para esse tipo de atividade

* Criou um Plano de Cargos e Salários avançado, tecnicamente estruturado com base em um “sistema de pontuação” inexistente na época, envolvendo complexidade, especificidade, especialização, independência, exigências de treinamento para as várias tarefas, etc., formando um sistema coerente e compatível com as necessidades específicas da atividade de petróleo e que cobria paulativamente a vida funcional do empregado, até sua aposentadoria, por meio de progressões funcionais de mérito e de tempo de exercício.

* Implantou, com base em idéias embrionárias existentes e respaldada pela experiência de sucesso implantada inicialmente na Unidade de Betim-MG, em 1971, um moderno e desburocratizado sistema de assistência médica complementar para os empregados e seus familiares, com amplas redes de estabelecimentos e profissionais credenciados, dentro de tabelas de preços previamente negociadas em patamares bem mais em conta, envolvendo a participação financeira conjunta Empresa / empregado. Esse sistema, logo adaptado e assumido por quase todas as grandes empresas brasileiras, tornou-se o que podemos chamar hoje de “ o maior sistema de medicina complementar “ do Hemisfério Sul. A força das Empresas participantes desse mega-mutirão de saúde complementar, conseguiu solidificar, estabelecer diretrizes de custos e de qualidade de serviços e penetrar no fechado mundo do sistema de saúde privado. Hoje, os hospitais, centros especializados, profissionais de medicina e a quase totalidade da classe média brasileira não conseguem mais sobreviver sem os “Convênios” .

* Implantou, em 1970, (segundo dados dos Serviços Técnicos de Estatística Atuária ), o primeiro modelo de previdência complementar brasileiro, tecnicamente auto-sustentável e auto-financiável pela participação conjunta Empresa / empregado, com base nos detalhados estudos e simulações realizados pelo conhecido e competente atuário Rios Nogueira, de modo a garantir a perspectiva futura de sua força de trabalho. Durante anos, foi esse estratégico item da excepcional Política de Recursos Humanos da Empresa que garantiu a manutenção da fidelidade, da cumplicidade e do envolvimento do empregado para com a Empresa e a conseqüente acumulação interna da experiência técnica, da pesquisa científica e do acervo tecnológico conquistados.

* Construiu e operacionalizou, bem antes do modismo daquela “qualidade total processualista “, seu sistema próprio de “ Qualidade “ - sem adjetivos - valorizando os aspetos técnicos, o detalhamento do sistema, a responsabilidade de cada um e a realidade primeira de que, junto com o sistema e o processo, a Qualidade depende antes do envolvimento e das atitudes de cada um. O Serviço de Engenharia da Empresa mantinha em S. José dos Campos, um “ Setor de Qualificação”, específico para desenvolver e gerenciar essa Qualidade e, especialmente, para “ qualificar “ a força de trabalho terceirizada, colocando-a no mesmo nível de exigências técnicas que a mão-de-obra própria.

* Desconstruiu o “machismo industrial” vigente, como a primeira, ou uma das primeiras Empresas brasileiras a colocar mulheres em regime de turno revesável, com uma autorização expressa e excepcional da Delegacia de Trabalho de MG, tendo em vista os impedimentos legais existentes.

* Realizou feitos e conquistas notáveis, em todos os campos da indústria petrolífera, contra a pressão externa e especialmente das “ 7 irmãs “ gigantes do petróleo, que sistematicamente apregoavam “não existir jazidas em território brasileiro. . . “ As descobertas no recôncavo baiano e, mais tarde, ao longo da plataforma continental, especialmente na Bacia de Campos, foram um atestado indiscutível da competência da Gestão da Empresa, de sua Política de R. H. e da capacidade de sua força de trabalho. No final da década de 70 e início dos anos 80, o Serviço de Engenharia da Empresa, mantinha cerca de 35 grandes, médias e pequenas Obras, distribuídas em 15 Estados brasileiros, com um orçamento bilionário de investimentos de tirar o sono de qualquer mensaleiro ou sanguessuga dos tempos atuais. . . Nessa época, seja nessas obras, seja nas Unidades Operacionais em produção, seja nos campos de petróleo, seja no transporte dos derivados, etc., jamais se ouviu falar de superfaturamento, de desvios de recursos, de favorecimentos ilícitos, de esquemas suspeitos. A construção e montagem das novas Unidades, das primeiras grandes plataformas da Bacia de Campos, etc., foram concluídas dentro dos orçamentos previstos, dos prazos estipulados e da qualidade contratada.

* Em todos esses anos, a Petrobrás sempre cumpriu a meta constitucional para a qual foi criada, levando e disponibilizando adequadamente e no momento certo a todo o território nacional, os derivados de petróleo necessários ao desenvolvimento do País.

* Jamais, nesse período, mesmo com uma ação dura, organizada e extremamente combativa, os sindicatos petroleiros conseguiram parar totalmente a Empresa. Eventualmente, aqui e ali, aconteceram interrupções pontuais da produção, que nunca chegaram a impedir ou a inviabilizar o cumprimento de suas obrigações para com o País. Os “ espaços “ eram ocupados pela Empresa, com sua proativa Política de R. H. e com um positivo nível de integração entre Gerências e colaboradores. O espaço de manobra dos sindicatos era reduzido, na maioria dos casos não levando a dificuldades e rupturas significativas.

Esses são alguns exemplos de conquistas, de pioneirismo, de inovação e de Excelência conquistados pela Petrobrás, graças à existência de uma adequada Gestão e ao suporte de uma inegável, reconhecida e apropriada Política de Recursos Humanos, que possibilitou a “ satisfação das quatro pessoas ” , de modo excelente .

Nesses primeiros tempos, as Unidades da Empresa recebiam a cada dia, mais e mais profissionais de outras Empresas, de múltiplas formações e especialidades, que vinham em busca de informações e de experienciações sobre as práticas e ações ali existentes, visando a possível implantação das mesmas, em suas respectivas Organizações. A Petrobrás de então, podia se orgulhar de ser o modelo e o exemplo de Gestão adequada, para um grande número de Empresas brasileiras, principalmente pela colocação em prática, de modo equilibrado e inovador, daquele teórico paradigma encontrado em todos os Manuais de Administração : nossos colaboradores são nosso maior patrimônio ! Talvez um dos grandes orgulhos do jovem brasileiro de então era conseguir “entrar para a Petrobrás” , algo semelhante ao que aconteceu com nossos pais e avós, que sentiam o mesmo orgulho por “entrar para o Banco do Brasil ” de outrora. . .

Mesmo nos conturbados tempos do regime militar de exceção pelos quais passou o País, jamais houve quebra ou interferências indesejáveis que sequer arranhassem esse patamar de excelência. Independente dos generais que dirigiram a Empresa nesse período, o corpo gerencial e técnico internos, se auto-conduziam dentro dos caminhos e direções traçados sob o viés exclusivo da Excelência.
Muitas conquistas, ampliações do parque de refino, implementação das pesquisas e trabalhos na Bacia de Campos, criação da Indústria Petroquímica - Cubatão, Camaçari, RS - , desenvolvimento da indústria brasileira de equipamentos pesados para a indústria de petróleo - a “nacionalização de nossa indústria” -, a busca da auto-suficiência, etc., etc., podem ser citados como exemplos dessa Excelência praticada pela Empresa.


2 - A ameaça da Excelência 1 : era neoliberal

Mas os tempos mudaram. Com a volta da Democracia, que poderia colocar definitivamente este País na rota da excelência e do crescimento sem limites, chegaram também os Partidos e os políticos, sedentos de poder, de privilégios, de artimanhas na manipulação de recursos para sustentação e perpetuação de seus sistemas pessoais de poder. Com a porteira das Empresas privadas definitivamente fechadas para esse tipo de aventura, só restava para eles um único campo de manobra e uma única porta : as Empresas públicas e estatais.

E aí começou a ameaça da Excelência da Petrobrás . . .

O governo Sarney tentou sem muito sucesso, utilizar a Empresa para atender a seus interesses políticos : os raros “estranhos no ninho” colocados para comandar esses objetivos escusos, não tiveram força para realizar sua missão, barrados pela coerência e pela força do Projeto de Excelência internos, então existente.

No governo Collor porém, já apareceram as primeiras ameaças concretas : foi colocado na Presidência da Empresa alguém vindo diretamente do “ Mercado ” que, em sua primeira decisão, determinou a demissão compulsória de 10% dos efetivos, técnicos ou não.
A porta começou a se abrir : concorrências duvidosas com cartas previamente marcadas, indicações de Diretores ligados a partidos políticos, uso do patrimônio do Fundo de Pensão dos empregados para aquisição de “ações podres” de empresas dos amigos da toda poderosa Ministra Zélia, etc. etc....
A segunda propalada “abertura dos portos brasileiros” para o capital estrangeiro, começou a aguçar os desejos adormecidos das “ 7 irmãs “ e deu o sinal verde para a derrubada do monopólio estatal da Petrobrás.

Mas a real e grande ameaça da Excelência da Petrobrás, começou de fato, no governo neoliberal. Foram de sua lavra a quebra do monopólio estatal do petróleo e a venda de 40% das ações da Empresa para os investidores estrangeiros que, de fato, começaram a ser seus “Gestores”, reorientando aquela excelente Gestão anterior, com base em um objetivo prioritário : satisfazer apenas a “ uma ou duas pessoas “ - os acionistas e, talvez, os clientes.
Equilibrando-se somente nesse duplo objetivo neoliberal, aquela Empresa excelente agora “ comandada ” pelos acionistas de Wall Street , começou a viver um perigoso ciclo de ameaças e dificuldades, inclusive pelo conseqüente desmonte de sua excepcional Política de R. H. anterior.
Foram dessa época a quebra da coerência do Plano de Cargos da Empresa, o incentivo à aposentadoria precoce da força de trabalho qualificada, levando embora parte da experiência e do acervo tecnológico acumulado em anos de investimento em pesquisa e qualificação, a proibição absoluta de reposição dos quadros de pessoal, com conseqüente inundação de um verdadeiro exército de terceirizados, mal treinados, mal pagos, mal assistidos, sem experiência, sem cuidados especiais para operar na segunda mais perigosa atividade depois da indústria rádio-ativa atômica, a quase esquizofrênica implantação do modismo da “qualidade total processual ”, aquela que só levava em conta o processo e a obediência aos padrões e deixava de lado o envolvimento e a as atitudes do agente. . .


Mas, vamos por partes :

* Quebra do monopólio e venda das ações da Petrobrás, para o capital estrangeiro.
Ao modelo neoliberal da época, não interessavam as prioridades ou os interesses dos Países envolvidos : seus deuses eram a globalização, a riqueza virtual financeira, o “Consenso de Washington”, as teorias econômicas aprendidas nas Universidades americanas, as ordens e desejos dos donos do mundo, a excelência do Estado sobre as pessoas . . . Enfim, o modelo só trabalhava “com uma perna ” , buscando satisfazer somente a “uma pessoa ” - o acionista . Se a Petrobrás, por sua excelência e seus baixos custos de produção, podia vender derivados mais baratos para não onerar a economia nacional, ela era proibida de fazê-lo, pois isso não remunerava os acionistas da Bolsa de Nova York, como desejavam . . .
No momento em que a escassez mundial de petróleo, a geométrica elevação do consumo mundial - China e Índia - e a incerteza política dos grandes campos produtores do Oriente Médio apontavam para a re-estatização das empresas nacionais de petróleo ( o que vinha e vem sendo feito por muitos países ), o modelo neoliberal buscava exatamente o contrário : quebra do monopólio, tentativa de desestabilizar e privatizar a Empresa, venda de grande volume de suas ações . . .

* Quebra da coerência do Plano de Cargos e da Política de R. H.
Como parte da estratégia de minar a excelência da Empresa, para ficar mais fácil sua privatização, a nova Direção neoliberal acabou com a coerência daquele excelente Plano de Cargos existente. Ao contrário de outras Empresas, a Petrobrás nunca “admitiu” gerentes, como gerentes : as posições gerenciais eram preenchidas por colaboradores de seus quadros internos permanentes, ocupantes de cargos técnicos e administrativos da estrutura do Plano de Cargos. Para remunerar essas novas atribuições e responsabilidades, era atribuída a esses agora “ gerentes” uma gratificação adicional correspondente a um acréscimo de cerca de 5 a 10%, em relação a seu salário do cargo permanente anterior. Mesmo quando existiam as famosas “ Remunerações Globais “ - específicas dos Gestores de primeiro nível da Empresa -, elas não eram significativamente superiores à remuneração dos cargos permanentes.

Essa sábia Política de R. H., não tornava esses gerentes “ imexíveis ” e / ou “ intocáveis ” : não era doloroso “ destituí-los ” por má gestão, por sua vontade pessoal ou por outras razões. A obra prima da gestão neoliberal da Petrobrás, maquiavelicamente, criou para esses novos gerentes remunerações desvinculadas do Plano de Cargos, com valores 500 a 650% maiores que seus cargos permanentes, começou a pagar-lhes bônus bi-anuais nababescos travestidos de “participação nos resultados ”., construiu um intransponível fosso entre o corpo gerencial e o corpo de colaboradores. E mais : tornou esses gerentes escravos de sua nova remuneração, convenientemente cooptados, defensores submissos de eventuais ilícitos cometidos por seus superiores hierárquicos, incapazes de questionar qualquer ação inadequada da Administração, sem condição de abrir mão dessa nova situação privilegiada. E, agora, realmente “ imexíveis ”, a não ser em casos extremos de gravidade absoluta. . . A Empresa começou a “fossilizar-se” em sua Gestão, pela ausência do saudável “questionamento” .

* Aposentadoria precoce da força de trabalho especializada
Na mesma linha acima, criou-se um “Plano financeiro de Incentivo à aposentadoria” , com o objetivo de “diminuir custos” , reduzir o efetivo próprio e inundar a Empresa de mão-de-obra terceirizada que, inclusive, não seria comandada ou induzida pelas ações dos sindicatos da Empresa, agora com amplo espaço de manobra e de aceitabilidade junto ao corpo de colaboradores, pela nova situação de distância do corpo gerencial. . .

Os novos gerentes da Empresa andaram por Refinarias e Unidades da Europa e E.U.A. e trouxeram de lá essa “novidade” do trabalho terceirizado . . . Mas esqueceram-se de anotar que, na ambiência de primeiro mundo, a mão-de-obra terceirizada era igual ou até mais bem preparada e treinada que a mão de obra própria. Em nossa pobre realidade de ignorância e de pobreza, essa mão-de-obra era praticamente “ analfabeta industrial ”, além de ser duramente explorada por suas empresas que tentavam ganhar um pouco mais nas costas do baixo nível de suas contratações.

Aposentadorias precoces, mão de obra terceirizada de baixo nível, “qualidade total processualista” sempre pródiga em cortar, enxugar, reestruturar para baixo ou demitir e sempre lenta e parcimoniosa em implementar projetos recomendados de melhoria, prevenção e segurança: esse triplo coquetel de impropriedades, trouxe duas sérias e concretas ameaças à Excelência :

- perda da experiência e de grande parte do acervo tecnológico da Empresa, que foi embora na cabeça e na agora inútil vivência do grande número de empregados aposentados, especialmente das áreas técnicas;
- ocorrência das grandes tragédias que abalaram a Empresa e jogaram a opinião pública contra a mesma :
. catástrofe do vazamento de milhões de litros de óleo na Bacia de Guanabara;
. idem no Paraná;
. afundamento e perda da maior plataforma da Empresa, na Bacia de Campos.
. além de vários acidentes, alguns fatais, nas diversas Unidades Industriais, especialmente envolvendo mão-de-obra terceirizada.

Com relação específica à Política de Recursos Humanos, além dos itens acima apontados, a era neoliberal trouxe outros desarranjos e não-conformidades.

* A Petrobrás, como diria Stanislaw Ponte Preta, transformou sua estruturada e coerente Política de R. H. em uma espécie de “samba do crioulo doido” , com cerca de uns 4 ou 5 sistemas de trabalho diferentes, envolvendo colaboradores admitidos em épocas diferentes, com direitos e deveres diferentes, com planos de saúde e de aposentadoria diferentes.

* O excepcional Plano de Saúde não fazia mais parte das Políticas permanentes da Empresa, passando agora a ser atrelado aos humores dos Acordos Sindicais anuais. O empregado passou a se perguntar : como ficarão as coisas se, em algum momento, os Sindicatos resolverem abrir mão dessa garantia antes inegociável, em troca de algum mimo ou de um aumento salarial mais expressivo de curto prazo ? . . .

* O sistema de avaliação e de progressão funcional foi reformulado, ficando mais dependente da opinião e da subjetividade do gerente e, não, de um conjunto de circunstâncias e de avaliações - tipo “avaliação 360º “ - como era a tendência na grande maioria das Organizações .
* As estruturas independentes e completas dos Centros de Treinamento foram desmontadas, atrelando-se a “atividade de desenvolvimento” à legalista e burocratizada “atividade de pessoal” . Os antigos treinamentos gerenciais e de equipes, desenvolvidos internamente, foram agora substituídos por Mestrados, Pós-graduações e outros, em um viés acentuadamente de “desenvolvimento individualizado” teórico . . .

* A ameaça à Excelência perpassou também pela famosa greve de 1991: como já anotado acima, os Sindicatos tinham agora um amplo espaço de manobra, que deixou de ser preenchido pelas Políticas da nova Empresa neoliberal. A ambiência e o clima não eram mais positivos. O que antes jamais havia ocorrido, aconteceu de repente : as Unidades operacionais foram “ tomadas ”, inclusive em algumas delas, por sindicalistas encapuzados que eletrificaram as cercas das sub-estações, ameaçando seriamente a integridade dos próprios colegas.
A produção literalmente “ parou ” por 30 dias ou mais, o abastecimento nacional ficou comprometido, a população brasileira se voltou contra a sua grande e Excelente Empresa. Hoje se sabe que, parte dessa primeira e grave ruptura, foi “ maquinada ” pelos estrategistas neoliberais, que estavam com o Projeto de quebra do monopólio da Petrobrás na pauta de votação do Congresso, esperando-se somente um “ grande motivo ” que pudesse “ mudar a cabeça ” da maioria nacionalista do Congresso. E os mal preparados sindicalistas, caíram feito patinhos nessa esparrela armada para eles. A quebra do monopólio foi conseguida . . .

* Quase no final dessa era, por pressão de Wall Street e dos “ acionistas de uma perna só ”, a ameaça à Excelência pela quebra da confiança Empresa / colaboradores subiu ainda mais : houve uma desesperada tentativa da gestão neoliberal de transformar e destruir aquele excepcional modelo de Previdência Privada anteriormente descrito, por um novo sistema em que o futuro dos colaboradores estaria nas mãos do sistema financeiro e das incertezas das Bolsas. . .
A Justiça brasileira enterrou temporariamente esse macabro projeto . . .

3 - A ameaça da Excelência 2 : era petista

A era petista nasceu sob o signo da esperança e da retomada dos sonhos. Provavelmente, a grande maioria da “ família Petrobrás “ , que sentia a Empresa ser ameaçada em sua Excelência e em sua própria existência, deve ter depositado seu voto de confiança nessa promessa de mudança e renovação.

Triste engano ! De todas as ameaças listadas e comentadas no item anterior, somente uma delas teve seu processo abortado : a reposição de efetivos, até como condição para se atingir a politicamente tão sonhada auto-suficiência na produção de petróleo nacional ( que Lula proclamou como sendo obra de seu governo...).

Todas as demais ameaças e muitas outras ainda piores, foram retomadas e colocadas no caminho da Empresa.

Vejamos algumas ( além das ameaças constantes no item anterior ) :


* Reposição de efetivos
Os novos colaboradores finalmente admitidos na Empresa, deixaram à mostra as feridas e as ameaças de uma inadequada Política de R. H. : são regidos por regras diferentes, por sistemas diferentes, têm direitos e deveres diferentes, não têm plano de Previdência Complementar, trabalham amparados por um estranho “ seguro de vida “ . A grosso modo, pode-se afirmar que esses 5.000 a 8.000 novos colaboradores, constituem “ empregados de 2ª classe “ .
Isso mesmo : a maior Empresa do Hemisfério Sul tem hoje empregados de 1ª e 2ª classes, realizando as mesmas tarefas, nas mesmas ambiências, com a mesma complexidade, sob a mesma bandeira . . . Isso sem falar nos 150.000 terceirizados que, dependendo das funções que exercem e da ambiência em que trabalham, podem certamente ser chamados de “ empregados de 3ª ou 4ª classes “ .
Essa é a nova “Política de Recursos Humanos de 5ª classe” , praticada hoje pela maior Empresa do Hemisfério Sul ! . . .

* Plano de Cargos
Definitivamente, ele virou agora um autêntico “samba do crioulo doido ” ! Obrigada por Wall Street a não colocar recursos em “peças mortas que não contribuem mais para os lucros daquela Empresa de uma perna só “, a Petrobrás, contra as determinações legais de seus Estatutos e de seu Plano de Previdência Complementar, dá aumentos anuais maiores aos ativos, criando “duas ou três faixas complementares” nas várias carreiras e negocia com os sindicatos cooptados, um pequeno “reajuste de consolação” para os aposentados e pensionistas . . . O Plano de Cargos ficou totalmente desfigurado !

* Sindicalistas cooptados
Como todo o Brasil está assistindo, a banda podre do PT, inundou as Estatais, os Órgãos Públicos, as Fundações, etc., com um grande contingente de sindicalistas, muitos deles em postos de Gestão .
No sistema Petrobrás não foi diferente : a maioria dos Sindicatos representativos da Empresa “ pulou a cerca “, estando hoje exercendo um estranho papel de parceria e cooptação com tudo que a Direção faz ! E é claro, todos esses novos “ sindicalistas / gestores “ , sejam eles “ experientes ” ajudantes de manutenção, operadores de Refinaria, auxiliares de escritório, administradores, contabilistas, etc., estão agora mimados e protegidos por aquelas “ remunerações de calar o bico “ , criadas na era neoliberal. . . Nada melhor para realmente cooptar qualquer um, até os “combativos e radicais” sindicalistas de antanho ! . . .

Essa é uma das maiores ameaças atuais à Excelência da Empresa : não que se tenha algo contra os sindicatos e os sindicalistas. Antes pelo contrário. Os sindicatos constituem a força legitimamente representativa do corpo de colaboradores, o contra-ponto de interesses entre a prepotência de muita Empresa e de muito Gerente inadequado e incompetente e a desproteção do subordinado.

A excelência da Petrobrás deve muito ao trabalho questionador do Sindicato, ao seu papel de fiscal contra as transgressões da Lei, ao aperfeiçoamento do processo negocial entre forças aparentemente antagônicas. Relações maduras, respeitosas e legais entre Empresa / Sindicatos só podem contribuir para a excelência de qualquer Organização. E alguns Sindicatos “dissidentes” desse rolo compressor petista de cooptação, continuam a exercer esse seu legítimo papel, mesmo contra as pressões das chamadas “ alas majoritárias “ .

Mas os outros, vindos da banda podre do PT e que na maioria não têm formação nem experiência adequadas em funções gerenciais, estão sendo colocados á frente de postos complexos, gerenciando pessoas e processos, sem preparação para isso. É´ uma lástima ! Como pode a Empresa manter sua Excelência com esse tipo de gestor que - à exemplo do chefe-mor - não ouve nada, não sabe de nada, não vê nada ?

* Desvios de recursos
Com todo o aparato montado pelo PT para sua perpetuação no poder e com esse tipo de “Gestor” que está à frente de muitas áreas importantes da Petrobrás, pode-se inferir como devem estar sendo desviados recursos significativos da Empresa, de atividades fins e essenciais para atividades secundárias e desnecessárias.
Pode-se , p. ex., citar a área de publicidade da Empresa : nos belos tempos, era uma área pequena, com verbas comedidas e modestas. Hoje, tornou-se uma área gigante, com milhões e milhões destinados aos Duda´s Mendonça da vida, numa duvidosa promiscuidade entre interesses da Empresa e interesses partidários. . .
Afinal, por que a Petrobrás precisa tanto de fazer publicidade ? Isso melhora a venda de seus produtos ? Melhora sua excelência ? Melhora sua aceitação pela população brasileira ?


* Plano de Previdência Complementar
Entre tantos desvios daquela exemplar e avançada Política de R. H. anterior, novamente, por determinação dos acionistas de Wall Street, a Empresa está tentando sepultar seu pioneiro Plano de Previdência Complementar. Afinal, para a Empresa de “uma perna só ”, que está prioritariamente voltada para satisfazer “uma só pessoa ” - os acionistas da Bolsa de Nova York - para que se preocupar com aposentados e pensionistas que não produzem mais um só centavo para os seus lucros ?

Uma das maiores ameaças à Petrobrás está em curso : desde maio, há uma guerra instalada na Empresa, com a quebra da confiança, a entronização da chantagem, o uso de mentiras e, até, o emprego de assédio moral coercitivo.
De um lado, a Petrobrás, a Petros e a ala majoritária da Federação Única dos Petroleiros ; do outro lado, os empregados, os aposentados, as pensionistas e alguns Sindicatos dissidentes.

Resumidamente, para não entrar em muitos detalhes : aquela tentativa da era neoliberal de colocar o futuro dos colaboradores na mão do sistema financeiro e das Bolsas e que fora “enterrada” pela Justiça brasileira, inclusive com a unânime repulsa dos Sindicatos, voltou com nova roupagem, com novas armadilhas.
O mote agora é um suposto “rombo” do Fundo de Pensão, de 5 bilhões, de 3,5 bilhões ou de 9 bilhões. A cada momento, dependendo das conveniências, os valores mudam . . . Só que esse “rombo” , na realidade, é formado por uma dívida da Empresa para com o Fundo, quando de sua criação, dívida essa oficialmente reconhecida pela própria Petrobrás, mas que ela só se dispõe a pagar, se os participantes abrirem mão de seu atual Fundo e aderirem ao tal Fundo “ garantido “ pelo “ desempenho das Bolsas de Valores “ . . .
O “ Contrato “, enviado para que os participantes abram mão de seus direitos e de “atos jurídicos perfeitos” passados, apelidado logo de “ kit da morte “, veio com a suposta chancela da Petrobrás, da Petros e da Federação dos Petroleiros, aqueles mesmos que, antes da “cooptação”, na frustrada tentativa anterior de FHC, foram os mais ferrenhos críticos ao projeto e conseguiram ““enterrá-lo ” na Justiça ! Suposta, porque está apenas “ carimbado ” com nomes ilegíveis e sem identificação, como se exige para um “ Contrato com valor legal ” .
Como faz bem uma gorda remuneração que tem o poder de transformar aguerridos guerreiros sindicalistas em dóceis cooptados de qualquer idéia ! . . .

“ Devo, não nego ! Mas não pago, a não ser que renunciem a seu direitos . . . “
Isso, em Gestão, se chama “ chantagem “ . . .
A proposta é “ tão boa “ que estão oferecendo, em troca, uma “ pequena compensação “ de três salários, ou R$ 15.000,00 ( o que for maior ) . São os ““trinta dinheiros “ que compraram a traição de Judas . . .

Independente de quem ganhe essa guerra, no final, o sistema de confiança entre Empresa / colaboradores estará seriamente abalado, tornando-se uma real ameaça para a Excelência da Petrobrás. . .


* A Melhor Empresa para se trabalhar
Há alguns anos, minha grande amiga Maria Amália Bernardi, quando era Editora Chefe da Revista Exame, lançou no Brasil a pesquisa americana “ A Melhor Empresa para se trabalhar “ . É´ um certame nacional, onde as Empresas são avaliadas em relação a vários itens, especialmente aqueles que constituem a essência de uma adequada Política de Recursos Humanos e que constroem a base para que a Empresa conquiste a Excelência. Participar desse evento e ser classificada entre as dez “Melhores Empresas para se trabalhar no Brasil” é uma honra e um objetivo buscado por centenas de Empresas brasileiras, a cada ano.
Por que a Petrobrás, a maior e mais bem equipada Empresa do Hemisfério Sul, jamais entrou para valer nesse disputa, nesses últimos anos ?
Coitada ! Desde que vem se afastando daquele seu percurso inicial e pioneiro - Gestão e Política de R. H. de ponta - e vem se afundando em uma Política de botequim de fundo de quintal, com os objetivos neoliberais de “ uma perna só ” , ou com os objetivos corporativos desse PT desviado, ela certamente não conseguiria uma boa colocação . . . Apesar de, no passado, já ter sido disparada, a melhor Empresa brasileira para se trabalhar . . .”

É claro que o importante não é conseguir uma boa ou má classificação nesse tipo de certame, mas refletir sobre como uma inadequada Política de R. H. pode ameaçar seriamente a manutenção da Excelência de uma Organização ! . . .

Nesse momento, parece estar claro para todo o corpo de colaboradores que a Petrobrás está conduzindo sua Política de Recursos Humanos com falta de transparência, com mentiras, com sofismas, com chantagem, com ameaças, com descumprimento das Leis e dos Contratos, enfim, com falta de ética .

E aí vem a pergunta : a Empresa que age assim com seu “mais valioso patrimônio” - os “colaboradores internos” , estará agindo com as “demais pessoas” do sistema - acionista, clientes-fornecedores e sociedade - com essa mesma falta de ética ?

É´ nesse cenário que se personaliza a preocupante frase-título desse texto :

Ameaça à Excelência ! . . .


Mas em tudo isso, fica uma certeza : os partidos, os políticos, os neoliberais, os petistas desviados, os acionistas de Wall Street, etc., passarão e a Petrobrás, que é maior que todos eles, permanecerá e, pela excelência de sua força de trabalho, conseguirá superar essas ameaças . . .



A Petrobrás só não é maior que o Brasil ! . . .



( * ) Filósofo, Pedagogo, Psicólogo, Administrador. Ex - Gerente de Administração e R. H. da Refinaria Gabriel Passos, do Serviço de
Engenharia da Petrobrás e da Fosfertil .

Autor dos Livros :

“ Recursos Humanos 100 %” ( edição esgotada )

“ Equipes 100% “ .

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